Que essas lições nos ajudem a evitar erros do passado. E que a classe trabalhadora se conscientize, se organize melhor na construção de processos que levem a uma sociedade mais justa, verdadeiramente democrática e igualitária
Editorial
da edição 578 do Brasil de Fato
A década
de 1960 foi marcada na historia do Brasil por uma crise econômica e política. A
economia brasileira patinava no seu falso modelo de industrialização dependente
do capital estrangeiro. Crescia a inflação e o desemprego. Mas por outro lado,
havia um governo popular do presidente João Goulart e a classe trabalhadora
vinha de um longo período de reascenso do movimento de massas desde a segunda
guerra mundial.
Essas
circunstâncias levaram a que as forças populares e o governo Goulart
apresentassem à nação uma saída para a crise: as reformas de base. As reformas
propostas significavam adotar um novo modelo de desenvolvimento fundado na
indústria nacional, na distribuição de renda e a melhoria das condições de vida
da população brasileira.
Para isso,
seria necessário controlar o capital financeiro através de uma reforma
bancária. Repotencializar a indústria brasileira, com uma reforma industrial
que reorganizasse a indústria para o mercado interno e para as necessidades do
povo.
Uma
reforma educacional para eliminar o analfabetismo e colocar todos os jovens nas
escolas, em todos os níveis. E uma reforma agrária que garantisse terra e
desenvolvimento no meio rural, gerando produção, emprego e renda ao meio rural.
A proposta de reforma agrária de Goulart foi a mais ousada até hoje, quando
propôs desapropriar todas as fazendas acima de 500 hectares, localizadas 10 km
de cada lado das rodovias, ferrovias e margens de lagos e açudes.
Essas
propostas uniam as forças populares que estavam nas ligas camponesas,
sindicatos, quartéis, campos e construção (como diz a música de Geraldo Vandré)
com um governo popular que tomava iniciativa das mudanças.
Porém, as
forças do capital se articularam com o império estadunidense – como bem
demonstra o imperdível filme de Flávio Tavares O Dia que Durou 21 Anos –
ou o livro deRené Armand Dreifuss (1964: a
conquista do Estado. Ação Política, Poder e Golpe de Classe, Vozes,
Petrópolis, Rio de Janeiro, 1981 – e organizaram um golpe de
Estado.
Sempre que
a burguesia, em todo o mundo, se sente ameaçada nos seus privilégios, joga na
lata de lixo as leis, a Constituição, a democracia, sua própria ordem burguesa
e apela para as armas, para a força bruta, para recompor seu controle sobre o
Estado e sua vontade política de classe. E assim foi aqui no Brasil. Dia 1 de
abril de 1964, dia da mentira, se perpetuou um golpe militar e se implantou uma
ditadura empresarial-militar que durou 21 anos!
Na
economia, a burguesia imperialista dos Estados Unidos socorreu o Brasil
trazendo seus dólares. Injetaram bilhões como investimento externo, que
produziram um “milagre brasileiro” de retomada do crescimento da economia,
baseado em grandes obras e deixando como saldo a maior dívida externa de todos
os tempos, que iria estourar anos mais tarde, na década de 1980.
E assim a
economia se transformou ainda mais dependente do capital estadunidense e das
empresas transnacionais em geral. Para impor sua ordem, nos primeiros tempos a
repressão se abateu contra todas as formas de organização da classe
trabalhadora: ligas camponesas, sindicatos, central sindical e setores
progressistas das igrejas. E se voltou contra todos os militares progressistas
que apoiavam o governo Goulart e as reformas de base.
Depois, a
partir de 1968, a repressão se aprofundou com a criação dos Destacamento de
Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi),
financiado por empresas. A partir daí, se cometeu todo tipo de crime –
torturas, assassinatos, ocultação de cadáveres etc. –, que atingiram a
juventude, o movimento estudantil e as formas de resistência armadas que as
organizações políticas haviam adotado.
A
repressão se amplia com o cerco à guerrilha do Araguaia (1973- 75) e nova onda
de pressão nas cidades. Mas foi também o início de sua queda. Pois a partir das
greves de 1978/79, a classe trabalhadora retoma as mobilizações de massa, a
campanha pelas Diretas Já, e finalmente, a primeira eleição para presidente em
1989, que representaram o fim e derrota da ditadura empresarial-
-militar.
Nesses
anos todos, além da falta de liberdade, da instalação de um regime ditatorial,
de políticos medíocres, tivemos milhares de brasileiros perseguidos, exilados,
torturados e assassinados. Nunca poderemos nos esquecer deles! A Lei de Anistia
de 1979 serviu apenas para esconder os responsáveis, que agora a Comissão da
Verdade não consegue recuperar e nem realizar a justiça necessária.
Nessa
semana que marca os 50 anos do golpe – início dessa tragédia social e política
que a sociedade brasileira viveu – certamente se multiplicarão eventos e
oportunidades em debates, livros e filmes, para recuperar a memória e refletir
sobre as lições dessa trágica história.
O jornal Brasil
de Fato se junta nessa recuperação histórica, sobretudo para a nova
geração de lutadores da juventude brasileira, para que conheçam a nossa
história, para que conheçam a sanha do capital e as perversidades do que é
capaz de fazer a burguesia brasileira para não perder seus privilégios.
Que essas
lições nos ajudem a evitar erros do passado. E que a classe trabalhadora se
conscientize, se organize melhor na construção de processos que levem a uma
sociedade mais justa, verdadeiramente democrática e igualitária. Situação que
ainda estamos longe de conquistar, diante das mazelas econômicas, sociais e
políticas que colocam a sociedade brasileira entre as mais injustas e desiguais
de todo o planeta.
Diretoria do
Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu
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