segunda-feira, 9 de setembro de 2013

“É preciso buscar maior impacto da ciência que é feita no Brasil.”

O engenheiro eletrônico e físico Carlos Henrique de Brito Cruz, professor titular do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), é um estudioso das políticas públicas de ciência e tecnologia. Nesta entrevista exclusiva para o Jornal da Ciência, ele analisa os avanços e desafios da ciência feita no Brasil nos últimos anos. Para Brito Cruz, ex-reitor da Unicamp, a ciência tem crescido no país e vive hoje “uma situação um pouco mais confortável, do ponto de vista do financiamento, do que viveu nos anos 1980”. Mas ele também aponta gargalos. “Atualmente, eu tenho a impressão que está faltando incluir na agenda da política para ciência no Brasil a questão da busca de maior impacto da ciência que é feita aqui”, diz. Na entrevista a seguir, ele detalha essas questões e vai além, abordando, entre outros assuntos, o programa Ciência sem Fronteiras e o papel dos estados no financiamento e incentivo às pesquisas.


Como está hoje a ciência brasileira em relação aos últimos anos? Quais são os gargalos, os avanços?

A ciência no Brasil tem crescido e eu acho que vive atualmente uma situação, ou vivia até uns dois anos, um pouco mais confortável, do ponto de vista do financiamento, do que viveu nos anos 1980. O número de artigos científicos com autores do Brasil vem crescendo, embora a uma taxa menor nos últimos três anos. O número de cientistas no país também cresceu nesse período, mas ainda precisa crescer mais, na academia e nas empresas. De modo que, com a consolidação dos fundos setoriais e dos recursos que eles proporcionam para o financiamento da pesquisas, nós poderíamos pensar agora em alguns outros desafios. Mas aí algumas coisas andaram para trás, quando se derrubou no Congresso o fundo setorial do petróleo, que corresponde a metade dos fundos setoriais e, na sequência, o Ministério da Educação acabou conseguindo a eliminação da dedicação de parte, mesmo que menor, dos recursos para a pesquisa. Não se sabe como terminará esse debate. Depois, os cortes de orçamento de 2011/2012 também afetaram o sistema, especialmente o acadêmico. Atualmente, eu tenho a impressão que está faltando – o que eu tenho defendido, inclusive fiz isso na reunião do CONFAP na Fapesp há dois meses e na 65ª Reunião Anual da SBPC na semana passada – incluir na agenda da política para ciência no Brasil a questão da busca de maior impacto da ciência que é feita aqui. Com a evolução que houve nos últimos 20 anos, nós precisamos incluir na agenda do desenvolvimento científico outras coisas, além da questão do financiamento. Uma delas é a busca de mais impacto da ciência.


Quais são esses impactos e como buscar isso?

Acho que um país ao usar os recursos do contribuinte para apoiar a ciência deve buscar três coisas: uma é ter/produzir um impacto intelectual no mundo da ciência. Ou seja, criar ideias que geram outras ideias no mundo da ciência. Fazer descobertas científicas novas. A ideia em si e não pelas consequências dessa ideia. Por exemplo, pode ser um impacto como o que se deu quando descobriram as ruínas da civilização andina no Peru, em Machu Pichu. Houve um impacto intelectual, por sabermos como foi o desenvolvimento dessa civilização na América. Outro exemplo é a descoberta da expansão do universo. Então, nós gostaríamos de ter ideias como essas sendo criadas por pesquisadores no Brasil. É o impacto intelectual da ideia em si. O segundo, muito importante também, é o impacto social das ideias. São ideias que trazem modificações positivas na sociedade. O programa BIOTA da Fapesp ilustra isso: há várias leis e decretos sobre conservação ambiental em São Paulo baseados em resultados desse programa. Temos que buscar sempre esse tipo de impacto da ciência. O terceiro, também muito importante, é o impacto econômico, ou seja, aquelas consequências que trazem desenvolvimento econômico, com a criação de mais emprego, competitividade das empresas, entre outras.


Não existe essa preocupação no Brasil com os impactos da ciência?

Eu acho que na agenda da política de ciência do Brasil há pouca preocupação com isso. O debate sobre a política para ciência ficou muito dominado por questões relevantes, mas que não são as únicas, como financiamento. E, no lado dos resultados, há uma predominância da visão quantitativista. Mais recentemente, intensificou-se uma espécie de utilitarismo, considerando-se que a ciência só serve se ajudar a indústria. Inovação é muito relevante, como também é relevante haver ideias seminais.





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