Conversando com versos (43): "Era uma vez", de Wilhelm Reich (1897-1957)

 

"Era uma vez"

Wilhelm Reich

Mães sentavam-se perto das fontes,

cantando, dançando,

acariciando docemente seus filhos,

guiando-os pelas correntes da Vida...

Ondas do oceano corriam docemente

para as praias de um mundo cheio de paz...

Homens e mulheres bebiam a alegria de Viver

dos movimentos de seus membros

e suas melodias rumo à eternidade.

O riso das crianças ecoava

em exuberância de vozes

cheias de alegria e delícias.

Olhares felizes nos olhos dos jovens,

refletiam-se em faces sorridentes

das virgens felizes de amor

e embriagadas de juventude

em corpos suaves.

De repente... um grito...

Que horror!

Antes nunca ouvido e nunca sentido,

não-convidado, perpetrado...

Era a peste que chegava:

Faces endurecidas,

Sorrisos hipócritas,

Braços cansados e ancas moribundas,

Faces lacrimosas, olhares embaçados,

Costas duras dobrando-se polidamente;

Corpos privados de amor,

Anseios privados de vontade,

Desejos privados de sensação,

Lutas privadas de vitórias,

O martírio da tortura conjugal...

Queixas, Gemidos,

Gritos de crianças, agonias...

Mortes, misérias e pensamentos tortuosos...

Patíbulos de covardes e paradas,

Marchas, medalhas, cadáveres apodrecidos;

Que confusão, que idiotice,

caçadas, perseguições, pesadelos...

Desgraça aos Homens

um milhão de vezes...

Fonte: O Assassinato de Cristo. São Paulo: Martins Fontes, 2ª Ed, 1983, PP. 180/181

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