sexta-feira, 29 de maio de 2015

Carta em defesa do Brasil, da democracia e do trabalho, por Fórum 21




Por Leonardo Boff

Em momentos de crise quando uma sociedade está perplexa,buscando um norte que aponte um rumo para um futuro melhor é sempre bom ouvir pessoas de notório saber, reconhecida moralidade, senso democrático e amor ao próprio país. Assim que publicamos aqui um documento sério, crítico e esperançador elaborado pelas referidas pessoas. Queremos divulgá-lo para ajudar as pessoas a pensarem no país e o que poderá ser melhor para todos. Quem quiser secundar esta linha de pensamento pode escrever ao e-mail abaixo indicado: Lboff

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CARTA EM DEFESA DO BRASIL, DA DEMOCRACIA E DO TRABALHO 

O Fórum 21, organização da sociedade civil constituída em dezembro, organizou uma Carta em defesa de temas caros a todos nós. A comissão final de redação foi formada entre outros por Luiz Gonzaga Belluzzo, Ladislau Dowbor, Leda Paulani, Reginaldo Moraes. A Carta tem apoio de vários movimentos sociais que secundaram o manifesto lido no Senado Federal, dias atrás. A Carta amplia os temas do manifesto para discutir outras reformas populares e conclama as forças de esquerda para formar uma frente para defendê-las. Se concordar com seus termos, por favor responda a Joaquim Palhares – <jpalhares2@gmail.com>

O pacto político e social da Constituição de 88 está sob um ataque de exceção. Contra a política, contra os partidos, especialmente do campo da esquerda, contra os movimentos sociais.

Este ataque representa a maior ofensiva organizada pelas forças políticas da direita e pelo oligopólio da mídia conservadora, desde 1968.

A luta contra a corrupção, que deveria atingir de forma indistinta e igual quem viola a legalidade e desmoraliza a política e o Estado, está sendo instrumentalizada por setores conservadores e foi colocada a serviço de um projeto autoritário de restauração de uma democracia restrita e de redução das funções públicas do Estado.

Parte da direita não hesita em clamar pela intervenção militar, como se o Brasil fosse uma república bananeira, e as nossas forças armadas fossem feitoras dos interesses do capital financeiro.

Promovem a contrarreforma política para manter o financiamento empresarial de campanhas eleitorais e partidos políticos e buscam terceirizar o Banco Central, pretendendo sua “independência” em relação ao Estado e sua submissão total à especulação globalizada.

Agendam a redução da maioridade penal e organizam ataques às conquistas das mulheres, negros e homossexuais. Incitam o ativismo judicial seletivo, antidemocrático, para desestabilizar o pacto político de 1988.

A direita e o grande empresariado promovem agora uma reforma penosa aos trabalhadores, para universalizar a terceirização, com um ataque severo às conquistas laborais do século passado. Aprovada, terá como efeito mais grave maior precarização das relações de trabalho e a redução de salários.

A democracia: reforma política e dos meios de comunicação

No Brasil, a luta pela democratização da política assume, hoje, duas formas principais.

Primeiro, a luta contra o financiamento empresarial de campanhas eleitorais e dos partidos políticos.

Segundo, a luta contra o controle plutocrático dos meios de comunicação, que são objeto de concessão pública e sequer respeitam as regras constitucionais do seu uso.

Contra a decadência do sistema político, as esquerdas e as forças comprometidas com a democracia e com o avanço social precisam se unir em torno da reforma política e pela democratização dos meios de comunicação.

Unir-se pela verdadeira liberdade de imprensa, que implica no direito à livre circulação da opinião, normalmente censurada pelos oligopólios, e pela transparência e democratização das concessões para rádios e TVs, que hoje são feitas no subsolo da política nacional.

As duas reformas são fundamentais para controlar o papel que o dinheiro exerce como agente corruptor da democracia.

No que concerne à reforma política, o principal mecanismo de democratização de campanhas eleitorais e prevenção contra a corrupção é o bloqueio do financiamento empresarial de campanhas e partidos políticos.

No que tange à reforma dos meios de comunicação, para limitar o poder do dinheiro é necessário limitar a propriedade e o controle, em uma mesma área de concessão pública, de órgãos de comunicação originários de uma mesma propriedade.

O controle de grupos milionários e de políticos sem escrúpulos sobre meios de comunicação confere vantagens políticas que pervertem a cláusula democrática e deformam as eleições.

A agenda destas reformas nos unifica, imediatamente, no seguinte: a) proibição do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais por empresas; b) proibição de concessão pública, em uma mesma área concedida, para mais de um veículo de comunicação do mesmo grupo empresarial.

A democratização do desenvolvimento econômico e a rejeição da austeridade

Apesar da crise global, os defensores do projeto neoliberal não desanimam na defesa dessa utopia direitista e dos interesses que ela atende.

Seu ataque quer atingir o que diferenciou, no mundo, o desenvolvimento brasileiro na última década: a expansão de salários e direitos sociais; a formação de um mercado interno ampliado pelo aumento do consumo popular; a recuperação de alguma capacidade de planejamento estatal; a rejeição do projeto de integração subordinada à globalização neoliberal.

A direita emparedou o Governo da Presidenta Dilma Rousseff em função da dominação que o dinheiro exerce na formação da opinião, por meio dos oligopólios da mídia, aproveitando os erros cometidos na formação dos preços públicos, na manutenção de alguns subsídios, combinados com a elevação das taxas de juros e a retração do investimento público.

Todo ajuste ortodoxo de corte neoliberal se assenta em dois pilares: juros elevados e restrições orçamentárias para investimentos em infraestrutura e para programas de combate às desigualdades sociais e regionais.

O “ajuste” ̶ como proposto no Brasil ̶ não toca nas desigualdades de patrimônio e renda, penaliza principalmente os trabalhadores e camadas sociais vulneráveis, fragiliza as forças progressistas diante do avanço das forças conservadoras.

O nosso “ajuste” deve ser outro. Deve garantir o crescimento com a ampliação dos investimentos para combater desigualdades sociais, regionais e gargalos produtivos. Deve potencializar um projeto de nação democrática e justa: a democratização da estrutura tributária brasileira é essencial para que o desenvolvimento soberano e inclusivo receba a contribuição dos que podem contribuir mais.

Nesse sentido, o Imposto de Renda deve ser reduzido para trabalhadores e camadas médias, mas majorado, progressivamente, para grandes salários e lucros distribuídos.

A tributação da riqueza acumulada deve contar com Imposto sobre as Grandes Fortunas e Grandes Heranças.

Finalmente, deve ser veementemente repelida a proposta de eliminar a independência do Banco Central em relação aos bancos que deve regular.

Depois do repúdio do povo brasileiro durante a campanha presidencial à proposta de um Banco Central “Independente” (em relação ao governo eleito), reavivá-la no Congresso Nacional é uma atitude que denota um enorme afastamento dos representantes do povo em relação aos interesses da maioria da nação.

A agenda mínima de reformas que nos unifica, imediatamente, quanto ao desenvolvimento, fundamenta-se no seguinte: rejeição da austeridade que é inepta para a retomada do crescimento; redução das taxas de juros; retomada do investimento público; reestruturação imediata do Imposto de Renda, com aumento das alíquotas para os muito ricos; taxação de Grandes Fortunas e Grandes Heranças; programa de largo alcance e qualidade técnica para combater a sonegação de impostos, políticas que devem ser debatidas na cena pública democrática, tanto no Parlamento como na relação direta do Governo com a sociedade.

Participação direta da cidadania nas decisões sobre políticas públicas

A Constituição Brasileira abre a possibilidade de participação direta da cidadania (art. 14) e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/1999) recomenda que os governos procedam discussões públicas sobre o Orçamento.

Esses preceitos ainda não se materializam em instituições e práticas efetivas. Consultas públicas, plebiscitos e referendos não devem ser eventos raros em uma democracia ampliada.

É necessário construir mecanismos que efetivem a participação direta e desenvolvam a democracia na definição de políticas públicas, prioridades orçamentárias e formas de financiá-las que ampliem a justiça social.

Pela defesa da democracia, do trabalho e da soberania nacional

Diante do avanço da direita, é necessário pensar hoje não apenas na estabilidade e na governabilidade democrática, mas na defesa de um programa mínimo que unifique as forças sociais comprometidas com a defesa da democracia, do trabalho e da soberania nacional.

Para construir, debater e defender esse programa, é fundamental a constituição gradual de uma Frente Democrática pelas Reformas Populares. Uma Frente que aponte, nos processos eleitorais e nas lutas sociais, para uma nova governabilidade com base programática.

A formação desta Frente é uma tarefa política de toda a esquerda, com participação ampla da sociedade civil não organizada em partidos e membros de partidos.

Lutamos há décadas pela democracia contra as mesmas forças do atraso que, hoje, querem voltar a limitá-la. Lutemos em conjunto para que a democracia brasileira supere a nova ameaça reacionária, e atenda progressivamente aos anseios do povo brasileiro por menores desigualdades, mais direitos e oportunidades de vida digna.



Diretoria do Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu
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