sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Como nascem os preconceitos



Por Frei Betto

García Márquez, em Doze contos peregrinos, conta a história de um cachorro que, todos os domingos, era encontrado no cemitério de Barcelona, junto ao túmulo de Maria dos Prazeres, uma ex-prostituta.

Com certeza se inspirou nas histórias reais de Bobby, um terrier de Edimburgo, Escócia, que durante catorze anos guardou o túmulo de seu dono, enterrado em 1858. Pessoas comovidas com a sua fidelidade cuidavam de alimentá-lo. O animal foi sepultado ao lado e, hoje, há ali uma pequena escultura dele e uma lápide, na qual gravaram: “Que a sua lealdade e devoção sejam uma lição para todos nós.”

Em Tóquio, ergueram também uma estátua, na estação Shibuya, em homenagem a Hachiko, cão da raça Akita que todos os dias ali aguardava seu dono retornar do trabalho. O homem morreu em 1925. Durante onze anos o cachorro foi aguardá-lo na mesma hora em que ele costumava regressar. Hoje, a estação tem o nome do animal.

Cães e seres humanos são mamíferos e, como tal, exigem cuidados permanentes, em especial na infância, na doença e na velhice. Manter vínculos de afeto é essencial à felicidade da espécie humana. A Declaração da Independência dos EUA teve a sabedoria de incluir o direito à felicidade, considerada uma satisfação das pessoas com a própria vida.

Pena que atualmente muitos estadunidenses considerem a felicidade uma questão de posse, e não de dom. Daí a infelicidade geral da nação, traduzida no medo à liberdade, nas frequentes matanças, no espírito bélico, na indiferença para com a preservação ambiental e as regiões empobrecidas do mundo.

É o chamado “mito do macho”, segundo o qual a natureza foi feita para ser explorada; a guerra é intrínseca à espécie humana, como acreditava Churchill; e a liberdade individual está acima do bem-estar da comunidade.

O darwinismo social é uma ideologia cujos hipotéticos fundamentos já foram derrubados pela ciência, em especial a biologia e a antropologia. Basta ler os trabalhos do pesquisador Frans de Waal, editados no Brasil pela Companhia das Letras. Essa ideologia foi introduzida na cultura ocidental pelo filósofo inglês Herbert Spencer, que no século XIX deslocou supostas leis da natureza, indevidamente atribuídas a Darwin, para o mundo dos negócios.

John D. Rockfeller chegou ao ponto de atribuir à riqueza um caráter religioso ao afirmar que a acumulação de uma grande fortuna “nada mais é que o resultado de uma lei da natureza e de uma lei de Deus.”

Na natureza há mais cooperação que competição, afirmam hoje os cientistas. O conceito de seleção natural de Darwin deriva de sua leitura de Thomas Malthus, que em 1798 publicou um ensaio sobre o crescimento populacional. Malthus afirmava que a população que crescer à velocidade maior que o seu estoque de alimentos seria inevitavelmente reduzida pela fome.

Spencer agarrou essa ideia para concluir que, na sociedade, os mais aptos progridem à custa dos menos aptos e, portanto, a competição é positiva e natural. E os que são cegos às verdadeiras causas da desigualdade social alegam que a miséria decorre do excesso de pessoas neste planeta, e que medidas rigorosas de limitação da natalidade devem ser aplicadas.

Nem Malthus nem Spencer se colocaram uma questão muito simples que, em dados atuais, merece resposta: se somos 7 bilhões de seres humanos e, segundo a FAO, produzimos alimentos para 12 bilhões de bocas, como justificar a desnutrição de 1,3 bilhão de pessoas? A resposta é óbvia: não há excesso de bocas, há falta de justiça.

Quanto mais são derrubadas barreiras entre classes, hierarquias, pessoas de cor de pele diferente, mais os privilegiados e seus ideólogos se empenham em busca de possíveis justificativas para provar que, entre humanos, uns são naturalmente mais aptos que outros.

Outrora os nobres eram considerados uma espécie diferente, dotada de “sangue azul”. Como quase não tomavam sol e tinham a pele muito branca, as veias das mãos e dos braços davam essa impressão.

Com a Revolução Industrial, gente comum se tornou rica, superando em fortuna a nobreza. Foi preciso então uma nova ideologia para tranquilizar aqueles que galgam o pico da opulência sem olhar para trás. “Que o Estado e a Igreja cuidem dos pobres”, insistiam eles. E tão logo o Estado e a Igreja passaram a dar atenção aos pobres (e é bom frisar, sem deixar de cuidar dos ricos, que o digam o BNDES e a Cúria Romana), como no caso do Estado de bem-estar social, do socialismo e da Teologia da Libertação, os privilegiados puseram a boca no trombone, demonizando as políticas sociais, acusadas de gastos excessivos, e a “opção pelos pobres” da Igreja. Preconceitos e discriminações não nascem na natureza. Brotam em nossas cabeças e contaminam as nossas almas.




Diretoria do Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu

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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Câmara Municipal de Rio das Ostras mantém silêncio sobre reajuste salarial dos servidores


Nesta quarta-feira, 29 de outubro, ocorreu nova sessão na Câmara Municipal de Rio das Ostras que manteve silêncio sobre o reajuste salarial dos servidores municipais.


Como na sessão anterior (28/10), após seguidas "indicações", os vereadores não se pronunciaram sobre o tema, mesmo estando presentes no plenário servidores municipais e representantes sindicais.

Mais uma vez, o Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu esteve presente, acompanhando os "trabalhos" legislativos e distribuindo materiais do sindicato.


Sendo em número de treze vereadores, nenhum pautou a questão, nem para cobrar do Executivo o envio urgente da matéria.



Todos os vereadores — da "situação" e de "oposição" —  comungaram de um silêncio obsequioso para não contrariar a vontade e interesse superiores.



Triste sina de uma cidade tão aprazível e acolhedora —  ainda mais na primavera! —  em não se ver respeitada nos seus comezinhos direitos: serviços públicos de qualidade e servidores públicos valorizados.




Só a luta transforma a vida!



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Conversando com versos (84): "Sinceridade", de Raul de Leoni (1895-1926)




Sinceridade
Homem que pensas e que dizes o que pensas!
Se queres que entre os homens e entre as cousas
Tuas idéias vivam pelo mundo
Crê bem nelas primeiro, sofre-as bem,
Faze com que elas vivam na tua alma,
Na mais sincera intimidade do teu Ser!
Há ideias que na vida cultivamos,
Pela volúpia inútil de pensar,
Pela simples beleza, pela graça
Floral, pelo prazer que elas nos dão ...
Por esse estado de ilusão chinesa
Em que nos adormecem a consciência:
Aquarelas efêmeras do espírito,
Passagens meigas da imaginação,
Idéias lindas que não criam nada!
Elas passam, radiantes, coloridas,
Na flutuação superficial do Pensamento:
Sim, são plantas aquáticas, nelumbos
De ouro equatorial, ninfeias encantadas
Pela prata dos luares sedativos,
Leves vegetações de tintas luminosas,
Sonhos das águas trêmulas que passam
-- Raízes a boiar no espelho das correntes --
Com músicas de côres pelas plumas,
Vaidades femininas pelas palmas,
Mas sem um grão de vida, sem um fruto,
Nessa esterilidade deslumbrante ...


As idéias que criam, as idéias
Vivas que elevam religiões e impérios,
Gênios e heróis e mártires e santos:
As idéias orgânicas e eternas
Que dão nomes aos séculos, destinos
Às raças, glória aos homens, força à Vida,
Que nutrem almas e orientam povos,
Fecundam gerações e geram deuses
E semeiam civilizações,
Essas terão que vir da nossa fonte humana,
Deitando profundíssimas raízes
No generoso espírito em que nasçam:
Terão que ser humanas, quer dizer,
Ser a nossa energia e a nossa fé,
Ser sementes recônditas, ser dores,
Sentimentos, paixões e quase instintos,
Ser vozes dos abismos transcendentes
Da consciência profunda ...ser nós mesmos ...
Porque as árvores mais fecundas são aquelas,
Que mais fundas estão nas entranhas do solo
E mais fazem sofrer o coração da Terra ...



Fonte: Leoni, Raul de. Luz Mediterrânea. 9ª ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1959, pp. 80/82



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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

No dia do funcionalismo público, Câmara Municipal de Rio das Ostras faz silêncio sobre reajuste salarial.



Nesta data - 28 de outubro - comemora-se nacionalmente o Dia do Funcionalismo Público. Merecido reconhecimento para quem, como classe trabalhadora, constrói o País e luta pela dignidade do trabalho.



Neste mês de outubro , também acontece em Rio das Ostras  a data-base do conjunto dos servidores municipais, incluindo os profissionais da educação - professores e funcionários de escola. Motivo a mais para mobilização da categoria junto à sua entidade de classe - o sindicato.




O Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu solicitou e reiterou audiência com o prefeito, tendo sido recebido duas vezes pela chefia de gabinete, que se comprometeu em agendar o encontro.

A Campanha Salarial unificada de 2014 teve início nas primeiras semanas do ano, quando os Núcleos e Regionais deliberaram por uma pauta de reivindicações comum às diferentes redes. O índice de reajuste unificado foi de 20% para recompor as perdas do último ano e as acumuladas em anos anteriores.



Em 2013, ano das jornadas  de junho e de julho, a luta dos servidores municipais de Rio das Ostras teve mobilização e força para ocupar seguidas vezes o plenário da Câmara, cobrando dos vereadores respostas às justas reivindicações da categoria. Naquele ano, o reajuste acabou em pífios 5,69%.




Outubro de 2014 já chegando ao seu término, o Executivo não apresentou sua proposta para ser discutida e aprovada pelo legislativo municipal. Enquanto isso, ouvem-se de diversas fontes explicações quanto à suposta "falta de caixa" na Municipalidade.




Por outro lado, tem-se notícia de um projeto do Executivo de reajuste de 35% nos vencimentos dos procuradores municipais, Num claro desdém para com o conjunto de trabalhadores que "ralam" no cotidiano para executar um trabalho em condições difíceis e com salários já defasados em relação ao custo de vida.





Com isso, aumentam a expectativa e certa angústia, quando o silêncio se instala sobre tema tão sensível à vida de cidadãos e cidadãs. Nem sequer um só pronunciamento durante a sessão.

Cabe uma resposta à altura - se possível, vigília dentro e/ou  fora do plenário - para cobrar reajuste ao menos próximo do aquinhoado pelos ilustres procuradores. Estes nada farão para "os de baixo". As sessões legislativas acontecem todas as terças e quartas-feira, a partir das 17h30min.




Só a luta transforma a vida!


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Projeto Sepe vai à escola (39): C. M. Professora América Abdalla, Nova Esperança, Rio das Ostras

No dia 28 de outubro, terça-feira, a direção do Sepe Núcleo Rio das Ostras e Casimiro de Abreu realizou um roteiro de visitas às escolas da rede municipal de Rio das Ostras.



Nesta data, comemora-se nacionalmente o funcionalismo público das diversas  esferas de governo: federal, estadual e municipal. Em Rio das Ostras, o feriado foi antecipado para a véspera, quando os servidores puderam gozar merecido descanso.


Mas essa data também marca a necessidade e urgência na continuidade da luta por melhores serviços públicos oferecidos à população e melhores condições salariais, de trabalho e de saúde para todos os profissionais, incluindo os da educação - professores e funcionários de escolas.



Nesta visita, os diretores sindicalistas convocaram a categoria para estar presentes nas sessões da Câmara Municipal  quando ocorre a discussão da proposta de reajuste salarial apresentada pelo Executivo municipal.

No caso de Rio das Ostras, a data-base ocorre no mês de outubro. Entretanto, até a presente data, não se tem conhecimento do envio da proposta à Casa legislativa. E muito menos, de seu conteúdo, vale dizer, o percentual de reajuste salarial.



É notório que a valorização  profissional  não se dá no abstrato dos discursos e das promessas - mesmo quando bem intencionadas - , mas em decisões políticas concretas como o pagamento de salários justos e dignos aos servidores, responsáveis diretos na execução de um serviço público de qualidade, tão exigido e necessitado  pelo povo riostrense. Mas, parece, não ser essa a visão dos nossos governantes e representantes legislativos.



Nesse dia de luta, mais uma vez,  o Sindicato esteve presente junto aos profissionais para dar prosseguimento à Campanha Salarial 2014, pautada nas assembleias da categoria.


Só a luta transforma a vida!

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terça-feira, 28 de outubro de 2014

Desatar os nós do desenvolvimento

Por Wladimir Pomar


O discurso que prevaleceu no movimento de adesão de parte considerável da direita da esquerda à candidatura Aécio foi o de que a sociedade civil unificada exigia mudanças que o governo Dilma não contemplava. Nessa sociedade civil eram incluídos não apenas as classes sociais intermediárias, ou o conjunto da pequena-burguesia, mas também os setores ou frações da classe trabalhadora assalariada que teriam ascendido à condição de classe média. Sem esquecer, é lógico, o empresariado. Ficariam de fora apenas os setores “ignorantes” e “desinformados” das classes “baixas”.

Teria se configurado, desse modo, uma frente única social capaz de tirar o Brasil do abismo a que teria sido levado pelas políticas econômicas “desastrosas” do governo Dilma. Sem se aperceber que as propostas tucanas reconduziriam o país à devastação dos anos 1990, a direita da esquerda mergulhou de ponta cabeça naquela ilusão da sociedade civil unificada. Para piorar, também se alimentou acriticamente de uma campanha de calúnias, mentiras e agressões que não se assistia desde 1989. A campanha de Collor contra Lula, naquele ano, foi transformada em coisa de amadores.

Apesar disso, as urnas de 26/10 enterraram a teoria da sociedade civil unificada.Demonstraram que parte da sociedade civil real, formada pelas diversas classes sociais reais da sociedade brasileira, tendo como maioria a classe dos trabalhadores assalariados, está relativamente vacinada contra as mentiras forjadas pelo partido da mídia e os chiliques do sistema financeiro nas bolsas de valores. E, também, contra as decisões do Mercado, esse ente mitológico que pretende governar a ação de todos os governantes, e que realizou uma ação unificada, incisiva e aberta contra Dilma, como há muito não se via nas campanhas eleitorais.

Por outro lado, as urnas também evidenciaram um descontentamento real, de setores consideráveis da pequena-burguesia e de setores populares, contra o governo e o PT. Esse descontentamento tem por base a falta de clareza no enfrentamento de casos de corrupção, em especial aqueles que envolvem petistas. Deita raízes no baixo crescimento da economia, apesar do paradoxo da taxa de emprego continuar alta. É alimentado pelos preços exorbitantes e pelos picos de inflação do tomate, da abobrinha, do quiabo e dos produtos industrializados. Cresce com os problemas de transporte, saúde e educação. E atinge níveis de paroxismo com o aumento da violência social e policial.

Foi esse descontentamento que permitiu à oposição de direita atrair a direita da esquerda e tornar tão apertada a vitória de Dilma no segundo turno. Descontentamento que só pode ser revertido com uma estratégia de desenvolvimento econômico e social que solucione e/ou mitigue os principais problemas estruturais da sociedade brasileira. Uma estratégia, política ou projeto de âmbito nacional que não pode ser conformada apenas por políticas parciais e, ainda por cima, dispersas.

Pouco adianta ter políticas de aumento da produtividade da força de trabalho para supostamente obter altas taxas de crescimento do PIB. Ou praticar o diálogo e fazer concessões para o setor privado, devolvendo-lhe o "espírito animal" na construção e operação da infraestrutura e no funcionamento dos mercados. Ou fazer desonerações para os setores oligopolizados, na esperança de que reduzam preços e mantenham empregos. Afinal, convivemos com os altos juros impostos pelo sistema financeiro e o “espírito animal” do setor privado prefere jogar nos altos preços administrados e no cassino rentista.

Precisamos de uma política, projeto ou estratégia unificada que tenha como objetivo alcançar taxas médias anuais crescimento de 4% a 5%. Só desse modo será possível absorver o "exército de reserva" que permanece como lumpen-proletariado e constitui a base principal da violência urbana. Só desse modo será possível dar dinamismo à economia brasileira, resolver os problemas básicos de transporte, saúde, educação e saneamento urbano, reconstruir a infraestrutura industrial e agrícola, e ampliar de forma consistente os avanços sociais já conseguidos.

Para materializar tal objetivo de crescimento é necessário elevar as taxas anuais de investimento para cerca de 25% do PIB. O que exige uma participação mais incisiva do Estado, ou dos recursos públicos, nesses investimentos. Em termos práticos, isso demanda juros mais baixos, para reduzir as despesas com a dívida pública. Demanda também taxas de câmbio administradas, para elevar a competitividade externa dos manufaturados nacionais. Exige uma reforma tributária, que taxe o capital fictício e dê lucratividade ao capital investido na produção. Coloca na ordem do dia a necessidade de criar um ambiente econômico de maiores oportunidades e concorrência. E impõe ao Estado criar empresas locomotivas que tracionem os elos privados médios e pequenos das cadeias produtivas nacionais e deem maior consistência às exportações.

Em outras palavras, é fundamental realizar um crescimento ampliado da produção industrial e agrícola, neste caso principalmente de alimentos para o mercado interno. E fazer com que tal crescimento da produção sirva não para a centralização do capital em poucas mãos, mas para a melhoria das condições de vida da maior parte da sociedade. Ou seja, a redistribuição da renda gerada pelo aumento da produção deve alimentar não só a reprodução ampliada do capital, mas também a reprodução ampliada da força de trabalho, evitando conflitos sérios entre consumo e investimento.

É evidente que, nas condições brasileiras, essa estratégia terá que incluir um novo tipo de regulação dos investimentos estrangeiros, de modo que tais investimentos se voltem para o setor produtivo e contribuam para o desenvolvimento das forças produtivas nacionais. O que exige uma legislação apropriada que inexiste hoje.

Em termos gerais, sem uma estratégia, política ou projeto desse tipo, que desate o nó do desenvolvimento econômico e social, será impossível dialogar com as forças políticas da direita da esquerda, assim como com os setores sociais da pequena-burguesia e das camadas populares atualmente descontentes. Portanto, será impossível desatar o nó político. Dificilmente se poderá criar um ambiente político de frente única, que isole a grande burguesia, em especial sua fração financeira, assim como os setores reacionários. E que permita uma mobilização social capaz de fazer com que o Congresso realize as reformas políticas democratizantes que o país necessita.

Queiramos ou não, para desatar o nó do desenvolvimento econômico e social teremos que atingir o núcleo duro do sistema financeiro e do monopólio econômico. A união política nacional não pode se furtar dessa realidade. Portanto, a combinação das ações de política econômica com as ações de mobilização social terá que estar presente em todos os passos das mudanças que o novo mandato Dilma quiser implementar.

Por outro lado, se o PT pretende  retomar a hegemonia política, no bom sentido da palavra, terá que ir além da elaboração dos projetos, políticas ou estratégias, tanto de desenvolvimento econômico e social quanto de reformas políticas. Terá que realizar uma profunda retificação das teorias e das práticas que o orientaram nos últimos 15 a 20 anos.

Terá que retornar ao chão das fábricas, às comunidades, às associações populares, à base da sociedade e retomar seus laços com ela. Sem participar do cotidiano de luta dessa base, o PT falará no vazio. Como aconteceu pelo menos no Rio de Janeiro, onde demonstrou incapacidade de conquistar os milhões de descontentes com os demais candidatos a governador, que votaram nulo ou se abstiveram.

Também terá que retificar suas práticas de combate contra desvios de corrupção. Como no ditado antigo, ao PT não basta ser honesto. Ele precisa sempre parecer honesto, incorruptível, se quiser enfrentar com vantagem os ataques de seus inimigos de classe. Em outras palavras, quando falamos em desatar os nós do desenvolvimento, falamos não apenas dos nós do desenvolvimento econômico e social, mas também dos nós políticos que entorpecem a ação da esquerda.




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Eleição 2014: não há o que comemorar

Escrito por Correio da Cidadania


Para quem está comprometido com a luta social e aspira a uma sociedade baseada na igualdade substantiva, a derrota de Aécio foi um alívio. Dos males, o menor, mas a vitória de Dilma não deixa nada a comemorar.

O saldo da campanha é tenebroso. Contratados a peso de ouro para manipular a opinião pública, marqueteiros venderam candidatos como mercadorias. Para diferenciar seus produtos, abusaram da ingenuidade da população.  Magos da pirotecnia midiática, reduziram o eleitor a consumidor, criando expectativas que não se realizarão. Para desconstruir os adversários, exploraram medos que alimentam falsos antagonismos e envenenam o ambiente político.

Na falta de substância política, a eleição foi transformada numa briga de torcida. Em clima de caça às bruxas, as paixões foram levadas a um paroxismo descabido. O apelo à emoção foi proporcional ao descaso pela razão. A virulência das agressões mútuas foi em razão inversa às reais diferenças entre os contendores.

O eleitor foi sistematicamente ludibriado. As divergências existentes entre as duas alas do Partido da Ordem são secundárias e circunstanciais. Os que hoje estão com o PT – Sarney, Maluf, Collor, Kátia Abreu – estavam ontem com FHC e Collor e anteontem serviam a ditadura militar. Amanhã podem perfeitamente debandar para o PSDB. À exceção de alguns extremados, os que mandam de fato – o capital internacional e a plutocracia nacional – estão muito bem servidos nas duas candidaturas. Basta ver o rio de dinheiro investido em ambas.

A completa desconexão do debate eleitoral com a realidade transformou o país num manicômio. Surpreendido pelo antagonismo entre petistas e tucanos, um desavisado que desembarcasse de paraquedas poderia até imaginar que o Brasil vive uma situação pré-revolucionária, quando, na verdade, o que está em questão é exatamente a conservação dostatus quo. A eleição foi apenas para escolher quem comandará a reciclagem do capitalismo liberal implantado por Collor 25 anos atrás. Nada mais.

O clima apocalíptico que tomou conta do segundo turno é despropositado e faz lembrar as legendárias guerras entre as famílias Sampaio e Alencar pelo controle da prefeitura de Exu no século passado. Para os que se alinhavam com o clã Sampaio, a vitória de um Alencar poderia, de fato, ter consequência real (e vice-versa), mas, para os que não faziam parte da corriola e estavam condenados a ralar para sobreviver, o resultado era indiferente. As famílias alternaram-se durante décadas no poder sem que a miséria se modificasse.

Deliram os que imaginam que o país está na iminência de uma ruptura institucional. Não há movimentação golpista alguma, nem à direita nem à esquerda. A única conspiração em curso é aquela que une as duas facções do Partido da Ordem contra o povo, patente na cumplicidade de ambas com a política de contra-insurgência preventiva para conter o conflito social e na irmandade na hora de arquitetar tenebrosas transações.

A briga de foice é um teatro e faz parte do jogo eleitoral. Quando é conveniente, o antagonismo é imediatamente suspenso. Quem se esquece da idílica cena de Haddad e Alckmin, descontraídos num requintado restaurante de Paris, em junho de 2013, poucos meses depois de terem trocado cobras e lagartos na renhida disputa pela prefeitura de São Paulo? Enquanto o pau comia solto nas ruas de São Paulo tomadas por jovens trabalhadores que lutavam contra o aumento das tarifas de transporte público, prefeito e governador estavam perfeitamente entrosados na política de repressão aos protestos e na estratégia de negociação com os gangsters que controlam os megaeventos internacionais.

Destituída de substância, a polarização entre as duas alas do Partido da Ordem só serviu para degradar o ambiente político. O brasileiro sai da campanha mais descrente nos políticos e sem nenhuma consciência sobre as causas de seus problemas e suas possíveis soluções.

Ninguém pode banhar-se duas vezes na mesma água do rio. O segundo governo Dilma não será uma repetição do primeiro. Pela força das circunstâncias, será mais conservador e truculento. As condições objetivas e subjetivas que o determinam deterioram-se, estreitando sensivelmente o raio de manobra para acomodar, através da expansão do emprego, do aumento dos beneficiários das políticas compensatórias e da cooptação dos movimentos sociais, as mazelas de uma modernização canhestra, que aprofunda a dependência e o subdesenvolvimento.

Na economia o cenário é sombrio. Os problemas acumulados na farra de consumo de bens conspícuos impulsionada pela especulação internacional têm consequências. O aumento da dependência externa deixa a economia brasileira à mercê dos humores do mercado internacional. O agravamento da crise mundial, que entra no seu sétimo ano sem perspectiva de solução, não abre espaço para o crescimento. A ameaça de movimento de fuga de capitais sujeita o país ao xeque-mate da dívida externa. Nesse contexto, as pressões da grande burguesia globalizada para que o Brasil realize uma nova rodada de ajustes liberais empurra a política econômica para a absoluta ortodoxia. As veleidades neodesenvolvimentistas são coisas do passado. O próximo Ministro da Fazenda será escolhido diretamente pelo mercado e estará mais próximo de Armínio Fraga do que de Guido Mantega.

No âmbito da sociedade, a perspectiva é de crescente convulsão. A modernização mimética que copia os estilos de vida e padrões de consumo das economias centrais agrava os problemas fundamentais do povo. A frustração generalizada com um cotidiano infernal acirra os ânimos e polariza a luta de classes. Sem vislumbrar saída para o circuito fechado que transforma a vida do trabalhador num pesadelo sem fim - na fábrica e fora dela -, o brasileiro torna-se um barril de pólvora prestes a explodir. O aumento da violência e o fim da paz social prenunciam um futuro de grandes tensões e crescente turbulência social.

Nas altas esferas da política, a classe dominante afia as garras para enfrentar o conflito social. A crise do sistema representativo reforça o consenso a favor de soluções repressivas para a inquietação social, aumentando a pressão a favor da criminalização da contestação social como pressuposto da estabilidade democrática. O giro conservador da opinião pública, o aumento assustador da bancada de deputados da direita mais desqualificada e a mobilização de uma classe média histérica deslocam o status quo sensivelmente para a direita. Contestado pela juventude que foi às ruas protestar contra os desmandos dos governantes, o sistema democrático brasileiro assume descaradamente seu caráter de classe e se afirma abertamente como uma democracia de segregação social. A liberdade política é privilégio exclusivo da plutocracia e se manifesta concretamente na possibilidade de escolha entre alternativas integralmente comprometidas com os parâmetros da ordem.

A presidente retoma seu posto no Planalto em frangalhos. Antes mesmo de assumir o segundo mandato, sua credibilidade já se encontra comprometida pela gravidade das denúncias que apontam a cumplicidade direta do Planalto com esquemas de corrupção arquitetados pela alta cúpula dos partidos da base aliada. Desta feita, não haverá um período de lua de mel. Ávida para voltar ao governo federal depois da quarta derrota consecutiva, a oposição não dará trégua. Sem arsenal ideológico e programático para diferenciar-se qualitativamente do governo petista, só lhe resta sangrar Dilma do primeiro ao último dia de seu mandato.

Ninguém passa impune pelo pacto com o diabo. Sem capacidade de mobilizar a população e prisioneira de compromissos espúrios, Dilma ficará nas mãos da máfia que, a mando dos negócios, controla o Congresso Nacional. Vítima da própria covardia, que não lhe permitiu enfrentar a tirania dos magnatas da informação, será objeto diário da chantagem da grande mídia. Sem meios para defender-se, tornar-se-á ainda mais dócil às exigências do capital. Se ousar desafiá-lo, será imediatamente confrontada com o espectro do “impeachment” democrático. É o modo de funcionamento das democracias burguesas contemporâneas na periferia latino-americana do capitalismo.

Para quem se ilude com a possibilidade de uma tardia redenção do PT, a ressaca da festa democrática será monumental. A juventude romântica e os homens de boa fé seduzidos pelo canto de sereia do “coração valente” logo perceberão que foram logrados e sentirão na pele a ingratidão da presidente. Assim que a população for às ruas para protestar contra os descalabros do capitalismo selvagem, as disputas fratricidas entre as facções do Partido da Ordem serão suspensas. Como irmãos siameses, as duas alas do Partido da Ordem estarão monoliticamente unificadas, armadas até os dentes, para reprimir os manifestantes com brutalidade, como se fossem inimigos internos que devem ser aniquilados, como aconteceu em Junho de 2013, nas jornadas da Copa de 2014 e toda vez que o povo se levanta contra os privilégios dos ricos. Passado o risco iminente de descontrole social, as duas facções voltarão a engalfinhar-se pela disputa controle do Estado.

A falsa polarização entre a esquerda e a direita da ordem somente será superada quando a os trabalhadores não tiverem qualquer ilusão em relação à possibilidade de que o capitalismo possa ser domesticado, seja pelo PT ou por quem quer que seja. O capitalismo dependente vive da superexploração do trabalho e tem na perpetuação de um grande estoque de pobreza um de seus pressupostos. A situação torna-se ainda mais grave quando a sociedade enfrenta um processo de reversão neocolonial que solapa a capacidade de o Estado fazer políticas públicas.

Do show de horror da eleição de 2014, sobra uma lição: para sair do antro estreito das escolhas binárias entre o ruim e o pior, é preciso que a esquerda socialista se unifique e entre em cena.



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